Hoje bateu aquelas saudades que há tempo não sentia, pensei logo em ti, és
o motivo destas saudades que os meus sentimentos fingem não sentir. Queria
ver-te pessoalmente um dia deste, e que olhasses bem nos meus olhos e dizer-me o
que ela na verdade expressa. Queria que um dia me visses a prantear por perda de
um ente-querido, da pessoa que amo na ausência porque você o levou para o além,
longe das pessoas que tanto lhe amam assim como eu. Pelo menos venha-me visitar
pessoalmente morte, verás os oceanos de dores que sinto pela
perda de um amor, de um ser que você o levou.
Queria dizer-te também que vejo tantas gentes algures desse universo a
prantearem porque você levou as pessoas que tanto amam. Vejo pessoas carentes
rogando para que tuas levas, mas, não os julgo, apenas pergunto-me se essas
pessoas conhecem-te mesmo ou não. A verdade é que eu também não conheço-te, mas
quem sabe amanhã! Desculpa, mas você é malvada, desgraçada, sem piedade, cruel,
bicha e sei lá mais quantos nomes que identifica a tua pessoa. Não passa de uma
infeliz que procura saciar a tua solidão com a minha humanidade. Mesmo assim
peço-te uma conversa pessoalmente para sentires a minha dor expresso pelo meu
rosto banhado de lágrimas, que antes foi branqueada e por ti perdeu o brilho. Aquelas
lágrimas que fecundou saudades quente. Quero ver-te morte, e se me permitires mostrá-lo-ei
o que é sentir dor por ausentes.
Provavelmente não sabe onde estou neste momento porque ainda não morri. Mas
saberás assim que leres este escrito; estou entre os cantos da solidão carente
de saudades, perante a sala de aulas e perdido dentro de mim mesmo e com fogo
de lágrimas queimando o meu rosto. Sabes o por quê? Porque você levou um amor
meu a cinco anos atrás e hoje tudo que desfila em minha cabeça são memórias
retratando os momentos que a vida deu-me a oportunidade de vive-lo. Mas peço-te
para não pensares que eu sou um museu, apenas sou um ser humano não alheio de
memórias. Vem morte, quero conhecer-te pessoalmente e esfregar na tua maldita
cara toda minha dor, dos meus irmãos também, e se irritar-me esfregar as dores
de toda a humanidade, especialmente das pessoas que eu amo e perderam os seus
amores por tua causa, dessas pessoas quero dizer-te pessoalmente e se ficares
irado com tudo que eu irei dizer-te, podemos lutar. Estarei preparado para
socar a tua cara nojenta.
Ao meu querido morto, subscrevo: ainda te amo, sei que nunca disse-te isso
quando em vida estavas, e também não sei os motivos.Esses sentimentos que sinto
por ti o meu coração sempre expressam em muitos textos que se encontram
espalhados quase em todos cantos dessa humanidade. Mesmo assim, hoje ainda
escrevo para ti na mesma folha que escrevo para a morte e, espero que ao leres
estejas perto dela para ela conhecer também a tua dor. Eis o motivo dessa
carta: saudades tuas. Essas saudades fazem-me pensar que foi ontem que te
perdemos, e que hoje é o dia em que o nosso quintal de Viana encheu-se de
pessoas nas algazarras pela tua partida. Submete-me a pensar na dor que a mamã
sentia naquele momento, e o que a tua irmã, a tia Nguejia,exprimia toda a dor
no solo daquele quintal por tu se ausentar. Penso também no quintal que em
segundo tornou-se num rio feito de lágrimas na fusão dos lacrimejo da Pungua,
Ngola, da Ila, do Ngongo e dos meus lacrimejo.
A última vez que escrevi para você havia-te dito que um dia contraia-te
como foi o dia do teu enterro, a verdade é que não foi nada bom, nunca foi bom
despedir-se de alguém. Naquele dia vi que o mundo é uma ilusão, que o nosso
esforço em conquista-lo é uma utopia enquanto existir morte entre os humanos;
vi que um piscar de olho pode vir ser o nosso último, e que nada é mais
importante do que a vida.
Quando o teu caixão foi posto naquele buraco com o solo avermelhado me
senti um nada sem ti. Peguei a tua bíblia e voltei por um instante no tempo em que
dizias-me para eu ter gosto pela leitura bíblica. Naquele dia queria levar a
bíblia em casa, mas o meu instinto triste pediu-me para pousar encima do teu
caixão e assim o fiz. O Ndongo abraçou-me tão forte depois de eu pôr uma pá de
areia na tua cova…
Desculpa, assim que eu lembrar mais desse dia, envio-te carta, espero que não
sinta-se culpado pelas saudades que nos tens causado. Culpa nunca foi tua, é da
morte.
Abraços morte, e a ti querido morto. Vindo do âmago de um vivo de saudades.
Por: Gonçalves Gonga (Dominitchiy)
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